Whenever I'm alone with you
However far away
O momento de irem pra sala.
Penumbra, a tela é ligada. Eles se sentam no sofá, o calor de seus corpos
conforta um ao outro, fragilizados pelo galgar das eras. Um olhar de ternura e
afeição percorre o intercâmbio usual entre eles. As mãos se entrelaçam, a
cumplicidade se instaura, mas uma vez. O noticiário adentra o lar, invasor
convidado:
- Cientistas confirmam: as
explosões solares vão se intensificar a ponto de eliminar toda a vida na Terra.
Temos de horas a dias, não se sabe bem. Muitos estão indo para bunkers, mas a
maioria dos especialistas dizem que não é uma medida eficaz. A qualquer momento
os aparelhos eletrônicos podem ser avariad...
Escuridão na sala. O luar,
intenso, torneia suas faces. Ele derrama lágrimas que iluminam os sulcos do seu
rosto, enquanto acaricia o dela:
- Tanto tempo que nós perdemos...
- Estamos aqui agora.
- Fico imaginando se tudo desse
certo antes, o quanto nós poderíamos ter feito juntos...
- Já conversamos sobre isso.
Nós ficamos juntos no momento em que foi possível pra nós.
- Eu sei, se eu tivesse sido
menos...
- Você nunca será "menos". Eu lembro a primeira vez que te vi. Era como se a sua figura, que não
tinha nada de assustador, me assustasse até a alma, mas de maneira doce,
incompreensível pra mim naquela época.
- Se eu fosse menos
inquiridor...
- Eheh, você se lembra, você me
abordando, em outro encontro? Você começava a falar o que pensava de mim,
dizendo sobre mim, eu ficando assustada, lutando contra o meu bom senso pra
você estar errado.
- Muitas vezes eu estava...
- Muito pouco, hoje sei. Lembro
o quanto você ficava com raiva das minhas negativas.
- Era difícil de entender,
parecia tanto que nós sentíamos o mesmo.
- Eu sei, mas a sua presença
era como se houvesse um sol. Tudo se iluminava, demais. Eu me sentia desamparada.
Ele riu de leve:
- Sem garantias nos seus
mistérios.
- Sim. Surpresa minha ao
descobrir que sempre haveria mistérios em mim pra você. Paradoxalmente, era só
eu me abrir. Descobrimos isso tanto tempo depois... Eu tentei conforto e
companhia com outros antes.
- Não me lembra disso... Eu
acabava por buscar outras, era como se fosse um intervalo, um descanso na minha
busca por você.
- Aí, inevitavelmente, você
aparecia de novo, me tirava de mim...
- Lembro do ódio que senti ao
receber seu convite de casamento.
- Nem me fale... te procurava
entre os convidados, na separação é que eu percebi o quanto eu queria que você
estivesse lá pra me tirar dali. Mas você sequer foi...
- Não aguentaria... Nos
beijamos a primeira vez um tempo depois.
- Foi como se eu explodisse de
tanto... sei lá o quê! Era como se eu não existisse, como se algo entre nós
anulasse tudo à volta. Você era sincero, mas o que dizia me assustava. Fugi...
- Ficamos tanto tempo longe...
lembro que dava voltas na conversa com amigos em comum pra perguntar de você.
- Muitas vezes, quando eu
pensava em você, aparecia alguma mensagem sua. Era como se a corrente nunca se
quebrasse.
- E nunca se quebrou. As
pessoas praticamente me obrigavam a te esquecer, eu fingia pra mim mesmo que
conseguia. Até eu te ver de novo...
- Até que nos conseguimos ficar
juntos. Eu, mais forte, você, mais suave e compreensível.
- Cada dia que eu acordo, olho
pro lado e dou o primeiro suspiro de alívio e felicidade.
- Minha vida anterior se tornou
um prenúncio do que vivemos hoje.
Eles se abraçaram, o sol
adentrava a sala, mesmo sendo noite. O mundo desaparecia ao redor.
- Adeus.
- Você acha mesmo, depois de
tudo, que isso é o fim?
- Não, mas não sei direito como
será depois, como vou te encontrar...
- Como você sempre me achou.
Enquanto o mundo jazia ao
redor, evocavam-se imagens de todos seus encontros: a beira-mar, no
restaurante, no café, no parque, no bar, na viagem, no vôo. Eles se
aconchegavam, numa infância acolhida da maturidade. O mundo moribundo, pra
eles, apenas se reconfigurando. O mundo, pra eles, sol.
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